sexta-feira, abril 14, 2006

O Código - 1 - O Sinal

A verdade entra-nos pelos olhos quando menos esperamos.

Saí por uns tempos em busca de novas perspectivas e realidades que, de tão estranhas, quase nos deixam indiferentes. Procurava, no fundo o sossego que o “short” e o “panamá” nos trazem quando, com ar embasbacado vamos dizendo (por um misto de sinceridade e simpatia):

-Beautiful, nice e thank you!

E assim estava eu nessa ladainha de turista deslumbrado, com o cérebro meio fechado às agruras da rotina, subindo os trezentos e setenta e tal degraus das Batu Caves, nos arredores de Kuala Lumpur, sonhando com o ritual estranho do Thaipusan, que tinha acontecido uns dias antes, quase vendo os corpos rasgados dos penitentes que cravejados de silícios arrastaram as suas figuras da devoção. Dava, ainda, para cheirar o calvário no meio dos restos de sangue e urina que manchavam o chão do imenso útero que são as cavernas santas.

Aqui a natureza pariu um exército de deuses.

Absorto e incomodado, porque isto de ser europeu tem os seus custos, pensava como seria irónico se, no meio daquela aparente anarquia de devoção e êxtase, conseguisse, tal asceta distraído ou sadhu pedrado, ter um vislumbre da realidade por trás da máscara. Como seria deslumbrante se a verdade me batesse de frente no momento em que me tentava esquivar das suas amarras.

Dito e feito!

Como um murro directo na arcada supraciliar direita, exactamente do lado onde as minhas dioptrias são mais elevadas, esbarrei com a imagem. Não foi acaso, não pode ter sido acaso! Estava Dan Brown e demonstrar que o plágio não era o seu combustível criativo e estava a decorrer a contagem dos votos autárquicos na Madalena do Pico. Sou racional e sei, com toda a clareza rural que tenho inspirado, que mesmo que o caminho seja sinuoso, a verdade acaba por nos cegar de tão próxima estar dos nossos sentidos. Assim, aquele aparente acaso não podia ser outra coisa senão um ensinamento, uma mensagem encriptada que do âmago da gruta se me revelava com o pudor de uma entidade etérea.

Feliz e ofegante (ainda não frequentava o health club da santa casa), peguei na máquina fotográfica e agarrei a mensagem para, mais tarde, no sossego do hotel, me dedicar à difícil tarefa de desvendar o código.


(continua…)

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