domingo, janeiro 20, 2008

Se fosse para o Tikall Inn tinha sido assim

Quase um mês foi o tempo de espera que José esperou por uma confirmação da sua reserva por parte do Hotel Tikal Inn. Três dias antes da data de chegada tentou contactar por e-mail e por telefone sem nunca ter obtido qualquer resposta.

Assim, foi com alguma apreensão que Às 17h e 30m entrou no Airbus 319 da TACA. Sabia que se dirigia para o desconhecido e não tinha qualquer âncora que o segurasse a uma realidade que dominasse.

Cinquenta minutos depois de uma viagem tranquila, aterrou no aeroporto de Flores. O dia tinha acabado e o bafo quente da noite aumentou a sensação de estranheza. Estava uma noite escura e o ar difícil de respirar. Poucas pessoas tinham saído do avião e, quase todas já tinham desaparecido nos automóveis privados dos hotéis. Inseguro, transpirando de calor e ansiedade, viu um homem de barba rala, todo vestido de branco e com ar decidido caminhar em sua direcção.

“Qieres táxi?”

Disse o Guatemalteco, numa voz distante e pouco empenhada. Via-se que sabia que José não tinha outra saída possível senão aceitar a oferta. Aliás, nem esperou pela resposta. Foi pegando nas malas e levando para a bagageira da sua velha carrinha.

José e a sua companheira aninharam-se a um canto do carro e trocaram olhares preocupados. O carro avançou lentamente para uma viagem de 65 kilometros, sem qualquer luz pública.

Para fazer conversa, ouvir vozes e sentir-se vivo, foi fazendo algumas perguntas. Ficou a saber que a zona era toda militar e que a força aérea e o exército ocupavam a maior parte do terreno em redor de Santa Helena. Soube, também, que no Tikal Inn não havia comunicações e que a luz era apagada Às 9 horas da noite. Que o hotel ficava no meio da selva, sem qualquer vedação ou protecção especial.

Fez-se silêncio e a jornada prosseguiu no meio do escuro da noite, aumentado pelas sombras fugidias das árvores que ladeavam o caminho. A selva densa engolia o carro e, lentamente, a força que tinha levado José até aquele local.

Na estrada viam-se sombras furtivas e muitos avisos sobre os perigos dos animais selvagens. A tensão tornava o calor insuportável.

Foi nesse estado de espírito que, com alívio relativo, viu uma placa a indicar o hotel Tikall Inn. A viatura parou junto a uma construção precária que servia de recepção e, na luz ténue ainda existente via-se o vazio. Ninguém esperava os viajantes e ninguém se parecia importar. Pago o transporte, a carrinha desapareceu na floresta com a mesma rapidez com que tinha aparecido no aeroporto, deixando o casal abandonado, no meio da floresta.

Ao fim de meia hora eterna, em que os mosquitos se tinham banqueteado com o sangue europeu, apareceu uma figura baixa e escura que, sem saudação nem interpelação adiantou rápido que tinham sorte porque havia uma “habitacion”. Mas que fossem rápidos a mudar a bagagem porque as luzes iam apagar.

Largada a bagagem na enxovia do quarto, José tentou fazer um reconhecimento do terreno, para saber, ao menos, onde iria passar as próximas horas de agonia, até que o sol salvador inundasse a floresta e os caminhos que percorria. Os passos levaram-no a um toldo onde três pessoas conversavam.

À sua chegada o tom de voz tornou-se um murmúrio e a desconfiança tomou conta daqueles rostos antes animados.

Barbara era Suiça, sexagenária e, José soube mais tarde, era médium que tinha vindo a Tikal porque forças magnéticas a tinham atraído para aquele local. Ingrid, a robusta secretária Alemã de Barbara, tinha tido sonhos que confirmavam o chamamento. Por seu lado, Joe, Americano, tinha sido literalmente puxado do México, onde se encontrava de férias, para encontrar as duas matronas.

José não quis ficar atrás. Sentindo que a situação, sendo exotérica, necessitava de um remate à altura não gaguejou e disse em mau espanhol, repetindo em péssimo Inglês que:

“La Guatemala me encanta”! Reparando que não tinha impressionado muito acrescentou:

“Mais vale bêbado famoso, que alcoólico anónimo”!

Eram frases que tinha lido nos cafés de Antígua e que lhe pareceram adequados à ocasião.

Manifestando dificuldade em entender o que tinha sido dito, a Alemã ficou-se pela cara séria e, acreditando que o encontro tinha sido marcado no céu por forças imbatíveis, convidou o casal a participar numa sessão “new age”, conduzida por um xamã Maia, no templo do Jaguar. A sessão deveria ser depois da meia noite e deveria ser realizada À luz das velas.

Chegada a hora lá foi o grupo improvável. A noite era impenetrável e a luz já tinha sido apagada há muito. Cambaleando e tropeçando nas raízes da floresta, perderam o caminho certo e acabaram por desistir de encontrar o templo do Jaguar e realizar a cerimónia ao pé de umas pedras desalinhadas que tinham tanto de templo Maia como de hotel de luxo.

Durante o processo, ficaram a saber que o aparato se devia ao facto de dia 18 ser mágico. E o fenómeno foi explicado: 18 de Janeiro de 2008 = 1+8 de 1 de 2+0+0+8 = 9 de 1 de 10. Ou seja 9 de 1 de 1. Por outras palavras 911 (não como o porshe mas como o nine eleven).

Fogo pensou José. Se a salvação da humanidade está nas nossas mãos, estamos tramados. Por isso esforçou-se e, não sabendo as rezas, entoou a música da Avé Maria, uma vez que não se lembrava da letra.

Feita a cerimónia, de consciência tranquila mas pouco convencidos do resultado, exaustos pela longa noite, deitou-se o casal esperando que tido corresse pelo melhor. Ao longe ouviram o Americano e a Secretária a resfolegar ladaínhas íntimas.

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