Faz 282 anos que a Madalena recebeu o honra de se transformar em Concelho.
Há muitas dúvidas sobre as circunstâncias que levaram à descoberta da Ilha do Pico. Parece-me incrível que, oito anos após a descoberta do Faial, o Pico continuasse por descobrir. Sobretudo sendo tão visível, tão grande!
Que desculpa poderá ser dada para o não povoamento da nossa Ilha que entrava dentro dos olhos de quem a quisesse ver?
Relendo a história, percebemos que um dos motivos que explicam o atraso no povoamento foi o medo da dimensão da Ilha e da sua Montanha. Tentando perceber o contexto, há dois argumentos que nos indicam direcções completamente diferentes; por um lado deveria ser assustador ver uma Ilha enorme, com um Pico imponente mas, por outro lado, como é que marinheiros destemidos que se lançavam ao mar medonho sem terra à vista e sem azimutes, tiveram medo de vir ao Pico?
Estranho, no mínimo!
Lá se resolveu o problema através das histórias do costume. Fez-se o apelo ao religioso. E assim se explica; "um ermita, do Faial, viu a Virgem Maria no Pico e meteu-se numa "chata" e foi remando até cá chegar e ser o primeiro colono".
Treta supersticiosa, penso eu!
O único facto conhecido e certo, é a ignorância sobre o ano e as circunstâncias que levaram ao "descobrimento" e povoamento da Ilha do Pico.
O que se sabe é que o povoamento do Pico começou na vila das Lajes e que, daí, deu um salto para os lados de São Roque.
A "História Insulana" de António Cordeiro, padre da Companhia de Jesus, publicada em 1717, antes do tal foral que deu à Madalena o seu estatuto de centro geográfico de qualquer coisa, mostra que o centro activo (social, económico e político) estava "do lado de lá" da Ilha.
A calheta do Nesquim era importante porque por aí se embarcava muito gado e muita madeira. Santa Bárbara tinha mais de cem habitantes, sendo muito deles ricos e nobres e produziam mais de mil e duzentas pipas de bom vinho.
Aí se lê que a principal Vila era a das Lajes, apesar do seu Porto só ser utilizável durante quatro meses por ano. Nesta altura a Vila das Lajes era a mais importante, com mais de duzentos habitantes aglomerados, aos quais somava um número indeterminado de almas espalhadas pelos arredores. Tinha Igreja Matriz e Vigário, gente nobre e rica e, sobretudo, capitão militar. Era um tal de Pedro Tristão Gularte.
Abreviando podemos verificar que a segunda Vila da Ilha era a de São Roque. Esta era muito rica em madeira, gado e vinho. Tinha Igreja Matriz, cento e cinquenta habitantes, Vigário e um capitão de guerra chamado Simão Ferreira. Sabe-se que antes deste, houve um outro que se chamava Fernão Alvarez que era "tão rico e tão nobre" que lhe chamavam o "Monarca do Pico".
Quanto à Madalena pouco está registado. Ficamos a saber que era uma boa zona de pescaria (refere sobretudo os salmonetes). Ficamos a saber, também, que havia uma total dependência da Ilha don Faial. Aliás, para atravessar o canal, os madalenenses tinham que colocar tochas a arder para que os barqueiros Faialenses soubessem que eles queriam atravessar o canal. Por cada passageiro uma tocha. Em caso de urgência eram colocadas mais tochas do que os passageiros reais. O logro não ilibava o pagamento.
Em síntese, o Pico em geral e a Madalena em particular, nada significavam no panorama político e económico nacionais.
Assim se percebe algumas reacções menos positivas dos Madalenenses em relação à Vila das Lajes e em relação ao Faial.
A Madalena era um "recreio" dos "Faiais" e um mero quintal da "Ilha em frente" enquanto que a Vila das Lajes já tinha vida social e económica autónomas. Aliás, também São Roque prosperava.
Percebe-se a primeira reacção contra as Lajes: os "lepras". Aí era o centro da civilização Picarota. Para a Madalena iam os excluidos e os pobres.
Descodifica-se, também, a segunda reacção contra o Faial. "Fugimos dos poderosos das Lajes para ficarmos dependentes dos do Faial, forte azar!".
Mesmo tendo sido há muito tempo, alguns destes ressentimentos chegaram, via oral, até aos nossos tempos.
Agora, 282 anos depois da grande vitória de nos termos tornado Concelho, é preciso ultrapassar os complexos de inferioridade e de estabelecermos uma relação saudável com os nossos vizinhos.
É preciso, também, não envergonharmos os nossos antepassados, mantendo um presidente da Câmara com as qualidades daquele que temos.
A não ser que queiramos voltar a ser uma Freguesia do Faial.