Tem de ser. Até parecia mal se deixasse a data sem uma referência. Poderia dar a entender que sou daqueles que considera a revolução dos cravos um levantamento militar inconsequente.
Não é o caso! O 25 de Abril, enquanto ruptura na continuidade política foi fundamental para a abertura de um novo ciclo. Saúdo o fim da ditadura, a instauração do regime democrático e, sobretudo, o fim da censura.
A liberdade de pensamento e a possibilidade de manifestar as ideias é, das liberdades, aquela que mais prezo.
Sei que se mantém algum caciquismo. A liberdade tem graus e nem todas as áreas geográficas gozam do mesmo estatuto. Continuam a existir, sobretudo no meio rural, algumas almas iluminadas que têm o poder de levar o povo ao beija-mão. São os padres, os líderes políticos, os presidentes de Câmara e, de forma menos vincada, outros poderes menores.
São, ao fim de três décadas de democracia, restos da herança fascista que, como sabemos acentava em dois pilares fortes (entre outros mais repressivos) que eram a religião e o modelo de distribuição de favores económicos e cargos públicos. Esta dependência em que uma vertente justificava a existência da outra, manteve-se, até aos nossos dias.
O seu poder vai-se, no entanto, diluindo com o passar do tempo. Digamos que se consome lentamente e que caminha para a extinção total. É um processo que, depois de começado, é irreversível. Felizmente!
Esta estrutura organizativa tem tido, do meu ponto de vista, como consequência nefasta, a diminuição da possibilidade de a revolução dos cravos se concretizar efectivamente.
A liberdade não é, ainda, uma realidade. Não falo da liberdade como um todo. Refiro-me à liberdade de expressão sem medo de represálias. Falo da possibilidade de dizer o que realmente se pensa sem temer que a filha, o neto ou o amigo, venham a ser perseguidos pelos tais poderes ainda instituídos.
Nos meios pequenos e rurais, como o nosso, a verdadeira liberdade provém da não integração e da não pertença à teia de interdependências locais. A verdadeira liberdade deveria advir, exactamente do oposto: da pertença e da integração total na estrutura social. É um paradoxo!
Enquanto não houver uma revolução cultural e do ensino, a liberdade é uma miragem. Como escolher o bom se apenas se conhece o mau e o medíocre.
Digamos que, relativamente aos ideais da revolução e às perspectivas que criou no que diz respeito à liberdade individual, ainda não chegamos ao vinte e cinco de Abril. Estamos no vinte e quatro vírgula setenta e cinco.
Dando voz ao paradoxo: Digo-o em total liberdade!