Ciência e Evidência
Aparentemente opostas, estas posturas convergem para o mesmo objectivo na medida em que buscam em simultâneo o conhecimento e as evidências que o fundamentam.
Desde o século XVI, com a afirmação de Descarte segundo a qual deveríamos aceitar como verdadeiro apenas o que for entendido como perfeita evidência que o conceito é reproduzido apesar de crises pontuais (sobretudo devido à matemática). Actualmente, apesar da dificuldade sentida por alguns especialistas, o conceito entrou em colapso e, cada vez mais se considera a certeza manifesta como uma construção subjectiva individual. A realidade é encarada como uma representação (o que parece ser) e a intuição e a percepção como obstáculos epistemológicos à passagem do senso comum ao pensamento científico.
As divergências epistemológicas entre a abordagem qualitativa e a quantitativa levam-nos a considerar a hipótese de existência de dois mundos. O mundo do indivíduo em situação e o mundo do colectivo, dos grandes números, não estando a ligação entre estes dois mundos definitivamente estabelecida. A impossibilidade de converter as leis gerais (do todo) em leis particulares (de todas as partes) que sentem os investigadores quantitativos é equivalente à dificuldade de defesa da validade externa das investigações de teor qualitativo.
A primeira dificuldade do “candidato a investigador” é, portanto, a tomada de decisão sobre a sua abordagem do real. Deverá sacrificar o particular em benefício do geral ou, pelo contrário, ignorar a construção de leis “fundamentais” a favor da compreensão do particular. Não nos parece fácil, se é que é possível, rejeitar à partida a existência de qualquer dos mundos referidos: o dos grandes números ou o do índividuo.
A principal função das teorias do contínuum paradigmático, apesar de não estabelecerem de forma clara a ligação entre as duas realidades é a de atenuarem a angústia da decisão. No entanto, do nosso ponto de vista, ao centrarem a discussão na compatibilidade metodológica e instrumental, estas teorias perdem de vista o problema central que é o da explicação e fundamentação da existência e compatibilidade das duas (ou mais) realidades.
Esta questão, apesar de central, é paradoxal na medida em que a construção e representação do mundo e da realidade são inseparáveis da existência do cérebro. Ou seja a validação e a prova dependem sempre da existência de um organismo que as codifica e interpreta em função da sua própria existência. Daqui a multiplicidade de interpretações e a afirmação de Raquel Gonçalves segundo a qual: A diferença (entre o homem comum e o cientista) é que o primeiro não sabe que não sabe, enquanto que o segundo tem consciência que sabe que não sabe.
Aceitando esta premissa deveriamos concluir que a posição primeira do cientista será a abstenção perante discussões cuja opção implique a verificação da prova pela positiva. Todas as hipóteses serão válidas enquanto não forem consistentemente refutadas. Em suma, a característica primeira do pensamento científico seria a aceitação da sua subjectividade.
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